“Imagine: Crescendo com meu irmão John Lennon”, de Julia Baird, não segue a tendência das biografias “definitivas”, baseadas numa pesquisa exaustiva e no objetivo de reproduzir a vida do biografo com toda a minúcia. Paradoxalmente, porém, pela proximidade da autora com o biografado, esta é uma biografia ao mesmo tempo mais e menos minuciosa. Menos, ao não ser extensiva a toda a vida do biografado, e mais, ao se basear, para o período e os aspetos que a aborda, na memória direta e nas informações de primeira mão da autora. Além de um índice remissivo não apenas de nomes, mas também de momentos/situações chave na vida de Lennon, o livro conta com o prefácio e posfácio da autora – e com uma amostra generosa da sua coleção particular de fotografias familiares inéditas.
Certa vez John Lennon afirmou que os Beatles eram mais famosos que Cristo. Essa fama acarreta, quanto ao conhecimento dos personagens, um efeito duplo: de um lado, sabe-se “tudo” de outro tal familiaridade impede o recuo necessário para passar por cima dos mitos cristalizados no caminho. Se, se sabe tudo, nada há a questionar e, principalmente, a descobrir. Este é o ponto de partida da meia-irmã de Lennon ao escrever a sua biografia. Ou seja, que muitas das certezas sobre a sua vida são mitos.
Não no sentido de serem mentiras factuais, mas no de serem tão erroneamente interpretados que já não correspondem à verdade. Nas esclarecedoras palavras da autora: “Este livro é a minha tentativa de dar sentido à minha própria vida e a do meu meio-irmão John. Todas as famílias têm histórias secretas e a maioria passa suas vidas tentando mantê-las escondidas até mesmo uns dos outros. Na nossa, entretanto, as histórias escondidas têm sido penduradas em uma tela gigante nos céus, convidando à verificação e critica de todos e à pesquisa e dissecação dos especialistas em Beatles e em John. Tivemos que deixá-los continuar, sabendo que grande parte as histórias estavam erradas. Na verdade, tantas coisas inexatas têm sido escritas sobre John e a nossa família que, ás vezes, tenho que lembrar a mim mesma as verdades básicas”. Verdades básicas dadas, agora, a público.
O primeiro e principal mito, naturalmente, é quanto à sua própria mãe, a grande e grandemente problemática personagem de sua(s) vida(s). os fatos básicos são conhecidos: a ausência do pai, a “desistência” de criar o filho, que é então entregue à tia Mimi, quando, na verdade, não lhe teria sido dada opção... Há ainda novas visões da adolescência e do primeiro casamento de Lennon, assim como de seus primórdios musicais, entre outros.
Em meio às revisões e nuançamentos que o livro empreende, há ao menos um reforço que não chega a surpreender. Trata-se da imagem de Yoko Ono. A meia-irmã de Lennon não diz nada dela, diretamente. Mas diz algo sobre ela ao narrar o seu comportamento quanto à casa de Liverpool que Lennon deixou para as irmãs. E que Yoko doa ao Exercito da Salvação local sem comunicá-las. Ela é fria e áspera ao conversar com a cunhada ao telefone, além de não recuar de sua decisão unilateral – incluindo ignorar as “provas” que exige da cunhada sobre a destinação da casa dada por Lennon. Considerando a fortuna formidável que ela mesma herdou, a cena é, no mínimo, bastante constrangedora.
A autora, inglesa de Liverpool; Julia Baird é filha de John Albert Dykins e de Julia Stanley, a mãe de John Lennon, cujo pai, Alfred Lennon, empregado na marinha mercante, jamais viveu com a mulher, apesar de oficialmente casados.
‘In O Norte’
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