segunda-feira, 17 de março de 2008

BRASIL – 1808 – PARTE I

“Dom João fundou a identidade nacional brasileira”

Dois meses cruzando o oceano, na única travessia conhecida na historia do Mundo na qual a corte de um império se mudou para a sua colônia do outro lado do Mundo. Há exatos 200 anos, completados no dia 08 de Março, 11.500 portugueses – o príncipe regente, a sua família e todo o aparato estatal, chegaram ao Rio de Janeiro, escapando por entre os dedos das tropas francesas de Napoleão Bonaparte. Que Brasil encontraram ao chegar? A verdade é que nem mesmo havia uma idéia de Brasil, como um sentimento de unidade nacional. Até 1807, o Brasil era uma grande fazenda extrativista de Portugal, conta o jornalista Laurentino Gomes, autor do best-seller 1808. “As províncias eram isoladas e o relacionamento delas era direto com Lisboa”.
“Até as rebeliões regionais defendiam a independência penas das suas regiões”, analisa. “E a corte veio para funcionar como elemento aglutinador. Sem isso, o Brasil provavelmente teria se fragmentado, como a América espanhola. Como disse o historiador pernambucano Manuel de Oliveira Lima, Dom João é o fundador da identidade nacional”. Gomes acredita que, sem o Rio como ponto central do Brasil, naquela época, não existiria o país continental que conhecemos hoje.
A corte portuguesa, que veio a terra em 8 de Março de 1808, encontrou um ambiente muito diferente de Portugal que deixaram. “Imagine: no final do verão carioca chegam dezenas de navios, com portugueses trajando casacos de lã, perucas, meias de lã, polainas”, diz o escritor. “No cais, uma colônia exótica, formada por traficantes de escravos, comerciantes, fazendeiros, muitos escravos, mulatos e negros libertos”. Dos 60 mil habitantes do Rio de Janeiro na época (a cidade mais populosa da colônia), 20 mil eram escravos (o equivalente à população inteira de São Paulo na época).
“O Rio de Janeiro era uma cidade dos ‘homens da grossa aventura’, conta Laureano Gomes, citando o livro de João Fragosos”. “Era onde paravam os navios que faziam as rotas transoceânicas, uma esquina do Mundo”. A corte não fazia uma vaga idéia do Brasil, pelos relatórios bastante precisos que recebia – mas é de se imaginar que o impacto visual tenha superado qualquer expectativa. “Os portugueses encontraram uma terra tropical, muito colorida, barulhenta, com muita dança nas ruas”, afirma.
Do lado de cá, também havia expectativa – apenas dias antes os cariocas souberam que a corte estava chegando. “Os cariocas tiveram uma decepção”, conta Gomes. Quem vivia por aqui, tinha nas moedas a imagem de um príncipe regente altivo e se depararam com uma figura diferente. “Viram um Dom João gordo, fatigado, com um andar titubeante”. A corte sofreu muito na viagem de Portugal até aqui. O navio em que veio Carlota Joaquina, esposa do príncipe, foi infestado por piolhos e as mulheres foram obrigadas a raspar a cabeça e tratar-las com banha de porco e pó antisséptico. Com vergonha, elas usaram turbantes no desembarque. “As mulheres do Rio de Janeiro acharam que os turbantes eram a ultima moda na Europa e também começaram a imitá-las”, comentou. Isto é algo que não muito de lá para cá...

‘Renato Felix’

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