terça-feira, 20 de maio de 2008

KEFIHA

Escuta-me o silêncio, tímpano oceânico e sentinela obscuro dos que ao relento armadilham as criaturas da alvorada, o eco de um sussurro que vem de um lugar onde o sacrifício não foi suficiente para aplacar a ira das entidades fantásticas que dominam o voo nocturno das paixões e a harmoniosa elasticidade dos mastins; escuta-me o silêncio, tu que podes ainda perdoar e retroceder, tu que esperas a nossa rendição incondicional, tu a quem pedimos para exercer a roda do destino a nosso favor sem que nos queiras atender, misericórdia sem misericórdia pelos que vão lacerados por uma culpa que lhes não pertence, malditos inflamados pelo baptismo de guerra que nos foi concedido, furor preso à cintura como o sabre dos que nos executam e que por interposição do nosso nome recebem o oiro por que jamais nos venderemos – escuta-me o silêncio, escuta-nos, porque há um nome definitivo que nos espera, uma pedra cintilante e um cântico magnânimo no fluxo mágico da terra e no derradeiro sol da angústia dos que procuram a estrela ignorada, o astro impossível que se oculta no obsessivo mistério da nossa solidão desesperada.

Amadeu Baptista

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