sábado, 17 de maio de 2008

O MISTÉRIO DAS LIVRARIAS

Não há lugar em que eu entre com mais reverencia e respeito do que numa livraria. Acho que até mais do que numa igreja. Sim, porque independente de crenças, os templos inspiram acatamento, sejam de qualquer religião. Afinal, assim como a beira de um mar ou de um rio, uma majestosa montanha, os altares, os santuários tudo o que convida à instrospecção provoca uma grave sensação. Um hiato de paz, de lembrança das coisas eternas.
Mas, as livrarias guardam um sublime clima de mistério e respeito. Tão diferente de uma loja de carnes, um açougue, uma farmácia, ou um supermercado...
Nas livrarias a gente sente uma energia diferente. Quantos segredos estão ali guardados naqueles livros. Quanta fantasia, quantas confissões, confidencias, desabafos, mentiras e sinceridades, enfim, parece que o pensamento humano está todo ali entesourado. E claro que está. A história, a ciência, a filosofia, tudo acomodado dentro daqueles volumes.
As lojas de livros são geralmente silenciosas, e as pessoas que nelas trabalham nos dão a impressão que também são afeitas à leitura. E por isso, decerto, mais educadas. As grandes e modernas são aconchegantes, têm espaços de estar, recantos de leitura, e até cafés. A gente fica sem saber por onde começar.
Transitando ao léu, por um dos corredores com livros de um lado e de outro, comecei a sentir que eles exibiam um desejo de serem vistos, tocados, puxados da prateleira. Quem sabe até uns não ficam com inveja de outros que costumam “sair” com mais freqüência. E lá vinha uma senhora graúda, toda enfeitada, com brincos e colar, o perfume chegando primeiro. Foi então que ouvi dois livros de filosofia comentarem um para o outro:
“esta certamente não nos vai puxar... Vai passar direto para o café ou para a ala da culinária”.
Os de religião, apesar de ficarem na mesma seção, não se questionaram. Seguem à risca o conselho de que “gosto e religião não se discutem”. O máximo que podem ter é algum sentimento de superioridade. Os compêndios budistas, por exemplo, devem pensar que, por serem vestustos, merecem mais respeito. Pensei escutar até a Bíblia falando ao “Top Te Ching”, apontando para o Livro dos Espíritos , de Kardec:
“aquele fedelho, que tem pouco mais de cem anos, já está se julgando o tal!... E até que ele é procurado, viu?” Mas, o “Tão”, que também se sente o tal, amenizou o despeito dizendo: Deixa ele... é bom que venham as novidades. Assim, nós que já temos milênios de idade, vamos sempre ver gente nova por aqui...
Dobrei a esquina e entrei na ala de literatura universal. Ali estavam Dante, Shakespeare, Goethe, Nietzsche, Tommas Mann, Dostoiewsky, todos extremamente bem vestidos. É um respeitável corredor. Quanta influencia eles causaram e ainda causam à humanidade.
Mas, já era hora de sair. Acenei mentalmente para os livros, e comunguei mais uma vez com silenciosa reverencia àquele espaço mágico. Tão mágico como a vida que me esperava lá fora...

‘Germano Romero’

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