Quando a vida nos obriga a enfrentar situações difíceis - como uma perda pessoal, por exemplo - é preciso entender que a eternidade está dando mais um passo.
Jorge Luis Borges (foto) escreveu algo muito bonito a respeito: “Tu és nuvem, és mar, esquecimento/és também o que perdestes em um momento/ Somos todos os que partiram. /O reflexo de nosso rosto no espelho muda a cada instante /e cada dia tem o seu próprio labirinto/A nuvem que se desfaz no poente é nossa imagem; /incessantemente, uma rosa se converte em outra rosa”.
Particularmente, eu detesto o caminho da perda, mas às vezes não há solução, e é preciso encará-lo. A seguir, algumas histórias a respeito.
O sacrifício e a benção
Um homem fez a promessa de carregar uma cruz até o alto de um monte, se tivesse certo desejo atendido.
Deus concedeu o que pedia.
Ele mandou fazer a cruz, e começou a caminhada. Depois de vários dias, achou que a cruz pesava mais do que supunha - e, com um serrote emprestado, cortou boa parte da madeira. Ao chegar no alto do monte, notou que - separada por uma fenda na terra - havia outra montanha.
Nela, tudo era paz e tranqüilidade; mas precisava de uma ponte para chegar até lá.
Tentou usar a cruz - mas era curta para isto.
E então reparou: o pedaço que havia cortado era exatamente o que estava faltando para que pudesse cruzar aquele abismo.
Outra história sobre a cruz
Num certo vilarejo de Úmbria (Itália), havia um homem que se lamentava de sua sorte. Era cristão, e achava o peso de sua cruz muito difícil de ser carregado.
Certa noite, antes de dormir, rezou para que Deus permitisse trocar seu fardo.
Nesta noite teve um sonho; o Senhor lhe conduzia para um depósi¬to. “Pode trocar”, dizia. O homem viu cruzes de todos os tamanhos e pesos, com nomes dos seus donos. Escolheu uma cruz média - mas, vendo o nome de um amigo gravado, deixou-a de lado.
Finalmente, como Deus havia permitido, escolheu a menor cruz que encontrou.
Para sua surpresa, viu gravado nela o seu próprio nome.
O guru de Mesure
Existia em Mesure, na Índia, um famoso guru. Conseguiu reunir um bom número de seguidores, e espalhou com generosidade sua sabedoria.
Na meia-idade, contraiu malária. Mas continuava a cumprir religiosamente seu ritual: banhar-se de manhã, dar aulas ao meio-dia, e orar durante à tarde, no templo.
Quando a febre e os tremores o impediam de concentrar-se, ele tirava a parte de cima de sua roupa e a atirava num canto. Seu poder era tão grande que a roupa continuava tremendo - en¬quanto o homem, livre das contrações, podia fazer suas preces com calma.
No final, voltava a vestir a roupa, e os sintomas retornavam.
“Por que você não abandona de vez esta roupa, e se livra da doença?”, perguntou um jornalista, ao ver o milagre.
“Já é uma benção poder fazer com tranqüilidade aquilo que devo fazer”, respondeu o homem. “O resto faz parte da vida; seria uma covardia não aceitar”.
Paulo Coelho
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