Eu sempre quis ter para mim uma mulher chamada Esther; assim mesmo sem mais delongas; pura e simplesmente... Esther. Num cochilo de moral, invejo Jorge Luis Borges, que ofereceu a uma pessoa homônima, o seu “ficciones”, talves o livro mais importante do argentino.
E eu o que teria para dar á minha adorável Esther?
Quem sabe não guardara para Ela todos os meus instantes de isolamento? E nesses lapsos de solidão, um silencio cortado apenas pela pronúncia de seu nome anteparo da insanidade. E sibilando em delírios febris, eu diria: Esther! E nada seria consumado.
A minha Esther fora parida de uma aventura à Espanha. Nascera em um navio cargueiro, depois de um vento que soprava do leste – pois assim tinha que ser. Crescera na região da Catalunha, no município de San Sadurní d’Anoia; Esther era extremamente ruiva, exalava um perfume de parreira, pisava o chão descalça, e se vestia feito quem se despia. Ali, tornara-se a mais cobiçada das mulheres.
No entanto, a minha Esther não servia para casar: com dotes de culinária e preocupada em cingir a roupa do marido. Esther tinha qualidades de cama. Atrevida, era ela. Amável, era Esther. Mas, ninguém sabia em qual delas acreditar. Esther era ferida por dentro – mas nunca a vira de luto. Esther não tinha mais de trinta anos, parece que já nascera com aquela idade; imagino que não teve tempo para ser menina. E cheguei a pensar que ela havia guardado os anos do viço primaveril para passá-los comigo.
A minha Esther comeria com as mãos; e faria do alimento, a eucaristia. Ela não tem nada a ver com a Esther que tem fama de ninfeta nas praias do Recife; ou sequer assemelhar-se com a Esther, dona de um famoso cabaré parisiense; ela não é, tampouco, parenta da ‘puta’ colombiana, mulher do cartel de Medellín. Esther também não se parece, com a lavadeira paraibana, que anda léguas, com uma lata na cabeça.
A minha Esther é uma quimera.
Amar Esther era o mesmo que começar a perdê-la. Viveríamos uns tempos num apartamento de sala e quarto, com vista para um beco, onde a lua nunca refletia, e onde os gatos no cio – imitavam o nosso coito. Comer Esther, embora seja uma expressão canibal, é a definição mais próxima da verdade. Esther seria alguém para se mordiscar, literalmente, os bocados de carne de seu corpo. “Trepar” com Esther é confissão vulgar; ela não é só desejo. Esther é um composto formado de tudo que é mal-intensionado. Ela é a minha penitencia. E, por isso, a minha Esther, não terminaria essa história ao meu lado. Seria uma lembrança, um instante lacônico, uma saudade – e isso já seria mais que aceitável; um romance.
Ninguém poderia amar Esther. Ela não toleraria. O amor confunde as pessoas. Talvez eu não soubesse, mas Esther sabia que o amor consumiria a nós dois. Quem ama não se contenta com sala e quarto. Apenas a paixão permite “trepar” no telhado – onde só dali se vê as estrelas; onde os carros não passam de vaga-lumes, provocando a noite. E as pessoas, são apenas pessoas infames, sem graça, ocupadas.
Antes de tudo, até mesmo da materialização de Esther, eu sabia que ela iria embora, na aurora que escolhesse; assim, sem comento. E mesmo tendo conhecimento disso, eu iria sofrer por Esther – e iria odiá-la, no primeiro minuto, com todas as minhas forças. E depois, mesmo sabendo também ser uma tolice, percorreria todos os nossos cantos: bar, praça, banca de miçangas.
E, desde o primeiro desses cantos, rezaria a oração que conhecesse, e o faria tão alto, que isso a encorajaria a continuar fugindo.
A minha Esther não era para ser de ninguém. Ela era uma poção de magia – que se coloca num caldeirão fumegante; um feitiço de mim. Esther não era para ser um pedaço do inferno para ferver o sangue de nossas veias; nem tampouco uma alucinação, uma fantasia que se encanta selva adentro para arrebatar a alma de quem a encontra.
Dizem que a Esther faz ponto na esquina da treze de maio.
Misael Nóbrega de Sousa
sexta-feira, 18 de janeiro de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário